"A Relevância da Escola Bíblica Dominical para o Crescimento da Igreja"
A educação, de um modo geral, compreende não somente uma
atividade, porquanto o ensino se dá desde o início da vida do ser humano,
quando este aprende a falar, a andar, a comportar-se, etc. Educar pressupõe a
criação das condições necessárias para que o ser humano aprenda e seja capaz de
efetivar esse aprendizado de forma que se consolide e se interiorize.
Para a compreensão da forma pela qual deve ocorrer o ensino,
é necessário identificar correta e claramente o que ele significa e, sobretudo,
quais são as faculdades do homem que devem ser consideradas como sendo o objeto
do ensino.
Para que isso seja possível, em termos educacionais,
pressupõe-se que entre o mestre e os discípulos se estabeleça uma relação
especial, uma relação de desejo de aprender e de direcionamento desse desejo
para que ocorra a aprendizagem.
A educação, em termos gerais, pode ser concebida, portanto,
como uma ação intencional e processual que propicia espaços de formação; é uma
ação que “envolve, geralmente, o ensino, embora se saiba que nem todo o ensino
é educativo”.[1]
A educação cristã é um processo de ação e de reflexão,
integral e permanente da comunidade de fé, que através da correta interpretação
e comunicação da mensagem bíblica, tornam possível a transformação e a
humanização do homem e da sociedade, para participar plenamente do Reino de
Deus, inaugurado por Jesus Cristo.[2]
A definição de Monti[3],
considerando-se as partes que compõem o seu conceito, pode ser assim
explicitada:
a) A educação cristã é um processo de ação e de reflexão: é
um processo porque representa uma ação dinâmica, que implica em um fazer
contínuo. Todo processo educativo intenta transformar a realidade através da
ação, com uma orientação determinada pela reflexão.
A prática e a teoria estão, assim, relacionadas de modo
indissociável, porque toda educação pressupõe uma prática prévia, sobre a qual
se realiza uma reflexão, uma tomada de distância da realidade, para tornar
possível um enfoque critico de sua transformação.
Quando a realidade é transformada, há um novo ponto de
partida para a reflexão e, em consequência, surge uma nova necessidade de ação,
em um processo que adquire, dessa forma, uma dinâmica contínua, ininterrupta e
permanente.
b) A educação cristã é um processo integral: como processo
integral, tem como propósito a integração de todas as áreas da pessoa humana em
três aspectos: com Cristo, em primeiro lugar e, através Dele, consigo mesmo e a
integração com a sociedade, com possibilidades para influenciar tanto a
sociedade como a cultura.
Toda personalidade do ser humano e a realidade social se
integram em uma única visão da educação cristã.
c) A educação cristã é um processo permanente: essa
consideração se deve ao fato de que o homem, por ser, por natureza, inacabado,
tende a buscar a sua perfeição. A educação é, portanto, um processo contínuo,
que somente finaliza com a morte.
A pessoa está em constante crescimento e enfrenta, a cada
dia, novas situações, que vão modificando sua prática e que demandam uma
correspondente reflexão, que obriga a uma participação efetiva, ativa e
responsável, seja qual for à etapa da vida em que se encontre.
Por isso, a educação cristã deve ser entendida como uma
parte da educação permanente, como um dos instrumentos possíveis, com suas
características próprias e originais, para o desenvolvimento do processo de
formação e de transformação.
d) Da comunidade de fé: a comunidade de fé, fundada em
Cristo, se manifesta como sendo o lugar onde se proclama e se reconhece a Deus
como o Criador.
Nessa comunidade, constantemente são evocados e recordados
Seus atos salvíticos, se adora em comunhão, se edifica o crente, ao mesmo tempo
em que a comunidade é edificada pelo Senhor, através de Seu Espírito, pelos
dons recebidos, pela Sua Palavra.
A tarefa educativa é responsabilidade da comunidade de fé em
Cristo, como observa Monti:
A Igreja herdou de seu Senhor esta oportunidade de
magistério. Ele foi o mestre por excelência. Cristo ressuscitado delegou essa
tarefa aos seus discípulos: tornar discípulos a todos os homens, ensinando-lhes
a observar tudo o que Ele havia mandado, conforme Mateus, 28:19 e seguintes.[4]
‘
A educação cristã se integra na realidade da comunidade,
“leva a igreja a ser igreja, voltando-se ao mundo para servi-lo. Este
ministério reside na totalidade da comunidade”.[5]
O mandamento de Cristo de fazer discípulos e ensinar aos
homens implica na existência de uma tarefa comunitária e pessoal de cada
crente, que é canalizada através dos diferentes dons que a igreja recebeu. Cada
um se torna responsável em se educar e educar ao outro, como parte de seu
ministério. Esta responsabilidade de cada crente – a educação pessoal e
comunitária – leva a uma nova dimensão da educação cristã: “a educação popular,
ou seja, daqueles que não possuem organização, forma, para que se tornem
capazes de agir como agentes conscientes e críticos de todo o processo de
mudanças sociais”.[6]
As escolas bíblicas dominicais e todos os grupos de reflexão
informal, para Costas, “constituem uma nova opção para a educação, na qual
crianças e adultos fazem uma leitura contextual da Bíblia, que acompanha um
compromisso profundo com a realidade”.[7]
Ainda, é responsabilidade da comunidade de fé capacitar seus
membros para o ministério do testemunho, o ensino e o serviço no mundo.[8]
e) Correta interpretação e comunicação da mensagem bíblica:
o fundamento da educação cristã se encontra nas Sagradas Escrituras. A leitura
e a interpretação correta das mesmas inspiram os atos da vida cotidiana e
confrontam o homem com Cristo em todas as situações, levando a uma constante
transformação da sua vida e de sua realidade.
Todo ser humano necessita da comunicação do Evangelho. A
Igreja, fiel à sua missão, comunica a todas as gerações e à comunidade não
crente a mensagem de Cristo, demandando uma resposta concreta a ela. A igreja
possui a revelação de Deus em Cristo; sua mensagem é única e invariável, porque
surge de um fato histórico.
O conteúdo da educação cristã é a mensagem libertadora de
Cristo, que encarnou o projeto de libertação humana que Deus Lhe revelou e as
Sagradas Escrituras revelam este projeto. O Antigo Testamento é a história da
libertação do povo de Israel; o Novo Testamento é o anúncio da libertação
realizada por Jesus Cristo, que torna possível a transformação e a humanização
do ser humano e da sociedade.
Nesse sentido
também se desenvolve o método de Calvino. A sua perspectiva social sempre é o
destino do pobre, excluído do bem estar econômico reservado para os ricos. A
“igreja dos pobres” recebe um sentido muito profundo em Calvino. Considera
os pobres como aqueles que irão instruir a direção da igreja (com uma referência
a Mateus, 26,11). Jesus, que será sacrificado na cruz, mas depois ressuscitará
e será levado ao céu, deixa seus discípulos com os pobres -“os pobres sempre
estarão convosco” – e os discípulos permanecem na terra como instrutores da
igreja.[9]
A correta compreensão da mensagem cristã faz com que o ser
humano se transforme em outra pessoa, que seja uma nova pessoa, que mude a
percepção de si mesmo e de suas relações com as outras pessoas, com a natureza
e com Deus.
À transformação pessoal corresponde a transformação da
comunidade que rodeia o ser humano, mesmo que, atualmente, tanto o homem como a
sociedade dependam de forças que fogem ao controle pessoal, pela dependência de
máquinas e tecnologias.
De qualquer modo, a educação cristã deve oferecer uma visão
do ser humano como centro do propósito de Deus, para não convertê-lo em um ser
desumanizado.
Assim, o ser humano deve ser salvo como pessoa, resgatado e
restituído da ação destrutiva e opressora da realidade e aceitar o desafio de
transformar e humanizar o ser humano e a sociedade, promover a pessoa nova
através de Cristo, faz com que a educação cristã adquira uma dimensão
libertadora.
O tema central de
Calvino é a vida da igreja como um modelo de liberalidade para a sociedade.
Esta perspectiva se mostra na importância dos ministérios, que têm a
responsabilidade do cuidado especial para com os pobres, os órfãos e as viúvas,
em uma clara reprodução do modelo bíblico. Na opinião de McKee, apud McKim, os
ofícios de presbíteros e diáconos “demonstram a convicção de Calvino de que a
igreja é uma instituição terrena que tem responsabilidade corporativa para com
os assuntos sociais e econômicos”.[10]
De um modo geral, o
pensamento de Calvino em relação à sociedade e à política social é mais uma
ética do que uma teoria política em sentido estrito. Bièler afirma que a ordem
política é sustentada por outra, ética: “surge de uma liberdade espiritual e
ética em Cristo. [...] O elemento mais especial na doutrina de Calvino é a
restauração do ensino bíblico”, de acordo com o qual o Estado é uma instituição
criada e desejada por Deus.[11]
Tomando como
referência conceitos de Biéler, é possível afirmar que o Reino de Deus ou de
Cristo é cósmico em sua visão e, em última instância, invencível. Todas as
coisas serão renovadas, inevitavelmente, se a igreja servir como testemunha
dessa nova ordem, como agente da Palavra e como seu primeiro modelo ou exemplo.[12]
f) Para participar plenamente do Reino de Deus, inaugurado
por Jesus Cristo: toda mudança ou transformação aponta em direção ao Reino de
Deus, o qual foi anunciado, conforme Lucas, 10:9; 11:9 e 12:32 e exige a
participação do ser humano para a sua realização.
Na prática mesma de Jesus se encontram as características da
inserção popular, do enfrentamento dos grupos dominantes, da subversão dos
valores idealizados pela fé israelita, o anúncio do Reino de justiça e de amor,
a filiação divina do homem e, por consequência, a fraternidade e a
solidariedade entre as pessoas.
Além disso, Cristo é exemplo de coerência de vida com sua
mensagem, tendo sido levado à morte, mas ensinando, a respeito dela, que é
ressurreição e vida para todos.
Diante dessas considerações, observa-se que a educação
cristã possibilita a capacitação de toda pessoa para sua consagração ao projeto
que Deus inaugurou em Cristo.
Em relação aos fundamentos da educação cristã, o ministério
de Cristo consistiu, principalmente, em ensinar e os discípulos a quem escolheu
são os alunos, aqueles que seguem creem e defendem os ensinamentos do Mestre.
Nesse sentido, mesmo com a passagem do tempo, os avanços
sociais, econômicos, tecnológicos, etc., longe de representarem um impedimento
ético ao fomento da religiosidade, sinalizam caminhos que devem ser percorridos
para chegar, a partir da fé, elementos que contribuam para a construção de uma
nova realidade social.
A incorporação, nas agendas das igrejas, de ações que tendem
a realizar uma incursão aos aspectos acima destacados, a partir de uma visão
histórica – ético-social – e contemporânea – técnico-cultural -, contribui
sobremaneira para que essa construção ocorra.
Desse modo Chartier[13]
destaca alguns aspectos que vêm sendo considerados por algumas das igrejas de
maior projeção, no sentido de crescimento junto às comunidades nas quais se
inserem e da sociedade como um todo:
a) Enfoque na evangelização como uma opção para transformar
as vidas dos sujeitos os quais, por sua vez, conscientes e capacitados,
desenvolvem ações de transformação em seu entorno.
A chave para isso é assumir posições estratégicas para
proporcionar mudanças, colocando a evangelização como fonte de transformações e
não mais como instrumento de legitimação de injustiças.
Para tal, no caso das igrejas evangélicas, existe o
envolvimento em projetos de evangelização em âmbito nacional, de redenção
pessoal, familiar e comunitária;
b) Desenvolvimento de um processo de doutrinamento
consciente, militante e comprometido com o Reino de Deus e as consequentes
transformações das condições de vida dos indivíduos, em uma sociedade, ou seja,
“um discipulado comunitário para a vida em comunidade”;[14]
c) Formação de uma nova geração de discípulos (líderes), que
sejam especialistas nos campos básicos do desenvolvimento social, tais como
saúde, educação e habitação.
Além disso, incursões nos campos que estimulam o
desenvolvimento econômico, como a tecnológica, a produtividade, a comunicação e
o manejo responsável da política.
Isso supõe a formação intencional de “quadros” para os
diversos campos, desde uma visão de médio até longo prazo, para que atuem em
redes de transformação, com base em uma fé viva, contextual, comprometida
consigo mesma e com a transformação da sociedade;
d) Articulação de ações sistêmicas dos fiéis em função da
transformação social do entorno administrado por cada uma das congregações, no
marco de ações individuais das igrejas locais e daquelas dispersas nos diversos
âmbitos sociais nacionais e internacionais;
e) Práticas cristãs e ações com sentido contextual e
missionário, de tal forma que a fé seja prática e possa estar inserida na
realidade vivida por cada igreja, em cada comunidade ou sociedade, bem como a
geração de uma consciência coletiva na comunidade evangélica sobre as
realidades do entorno da vida e da missão.
Ressalta-se, ainda, em complemento ao anteriormente exposto,
a observação de Bonino de que o maior aporte das igrejas protestantes à cultura
do século XX e deste início de século é a educação, as suas escolas, seu
projeto pedagógico, dentam do qual o ethos
das comunidades tem um importante papel a desenvolver, no sentido de recuperar
a dignidade humana em meio ao processo de globalização, formando indivíduos
críticos, “contribuindo para a consolidação de uma cultura dinâmica, não
atrelada às limitações de um cristianismo católico conformista, mas inovadora
em suas posições e possibilidades” [15].
No século XX, as escolas e os hospitais construídos pelos
protestantes, junto ao espírito prático e empresarial de seus missionários,
motivaram importantes setores da sociedade (intelectuais, artesãos,
comerciantes, empresários, etc.) a engajarem-se às ideologias liberais e
capitalistas emergentes da Europa e dos Estados Unidos.[16]
Também a liturgia baseada no discurso teológico e racional,
baseado na análise cuidadosa do texto escrito, reduziria o poder cultural da
igreja católica, essa realidade foi-se transformando na medida em que essas
mesmas instituições passaram a assumir um papel cada vez mais voltado para a
consolidação de uma nova cultura religiosa.
Essa cultura, segundo a análise de Nascimento, está embasada na
consideração acerca da cultura formulada por Norbert Elias, que a identifica
com todos os aspectos que separam homem e natureza, ou seja, suas práticas
sociais, que envolvem a educação, a economia, a religião, a arte, a política, a
moral e a técnica.[17]
Com efeito, ao menos no caso brasileiro, a cultura protestante
se classifica, dentre outros aspectos, pela forma como se propagam as mensagens
religiosas, sendo que os protestantes vinculados à igreja luterana,
presbiteriana, congregacional, anglicana e batista se vinculam mais a uma
cultura letrada.
A escola dominical, instituída com um propósito em Deus,
como um todo, é fundamental para o crescimento da Igreja, por diversas razões,
como observa Zuck:
A escola dominical reúne a todos os membros da igreja para
proporcionar-lhes instrução cristã; é a reunião da Igreja em classes separadas,
conforme a idade, e um agente de evangelização da Igreja. É também o ramo
educativo da igreja, que efetivamente tem todas as oportunidades de ensinar e preparar
as novas gerações, que aprendem os princípios da Palavra de Deus refletidos em
situações de sua vida diária. Aprendem o companheirismo, a obediência, a
fraternidade. É um ente formador de discípulos, já que crianças e jovens serão
os futuros e são as presentes ferramentas de Deus.
Na escola dominical se alcança uma aproximação do fiel com a
Igreja, sendo ferramenta para chegar também às famílias e à comunidade de cada
um.[18]
Calvino também ensinou que a Palavra de Deus “não tem
eficácia, a menos que, ao mesmo tempo em que é ensinada, o Espírito Santo age
nos corações dos ouvintes, produzindo a fé e fazendo que as mentes dos homens
sejam receptivas à Palavra”.[19]
Observa-se, então, que Calvino não ensinou que o Espírito
faz que a Escritura se converta na Palavra de Deus, mas que legitima o coração
dos crentes a compreender que o conjunto objetivo da verdade bíblica é de
origem divina e, portanto, autoritariamente correto. O Espírito Santo, como
afirma Calvino, trabalha juntamente com a Palavra escrita, interiormente.
A presença do Espírito Santo de Deus eleva a educação cristã
além da mera programação, da metodologia e das técnicas. A participação do
Espírito na educação a converte em um ministério sobrenatural e divino.
Para Zuck, a educação cristã adquire nova perspectiva quando
considerada como obra de Deus e não do homem, impulsionada pela dinâmica do
Espírito. Vista como algo divino, o ensino das verdades de Deus se torna uma
responsabilidade de grandes proporções e implicações. Ao reconhecer a obra do
Espírito, se verifica que a educação cristã envolve objetivos elevados, um
Livro sagrado, verdades divinas, almas eternas, questões celestiais e um Mestre
divino e infalível.[20]
Também acrescenta Zuck que há duas razões pelas quais o
ensino do Espírito é sobrenaturalmente sublime: não há no mundo uma disciplina
didática comparável ao ensinamento de Cristo através do Espírito Santo, tanto
pelo fato de que é infinito o número e a variedade de temas a serem ensinados,
como pela forma em que Ele,
por meio do Espírito, adentra no mais profundo do coração e ali, não apenas
revela a verdade de magnitude transcendente, mas ajuda o aluno a captar o
significado do que é revelado. Em Hebreus, 11:3, se diz que “pela fé
compreendemos” e João, 16:12-15 claramente promete que Cristo continuará o
ensinamento que iniciou quando estava na Terra. [21]
Do mesmo modo, ressalta-se que quando se fala de educação
bíblica, reforçando o anteriormente exposto, se verifica que as informações, os
dados, são apenas um aspecto do processo educativo, que se completa com a
formação da pessoa.
A educação cristã, dessa forma, é concebida como um processo
de formação ou de crescimento pessoal, com elementos distintivos, os quais são
assinalados por Schaeffer[22]:
a) Trata-se do crescimento da imagem de Cristo, uma vez que
a educação cristã não consiste simplesmente na formação de um homem moral.
Certamente se encontra embasada em questões éticas, mas vai, além disso, por
ser mais que um ensinamento humanista. Também não consiste no desenvolvimento
de alguns valores, para que o homem adquira atitudes cristãs;
Na educação cristã, existe um modelo de homem total, para o
qual se dirige o crescimento. Não se trata de um modelo confuso ou relativo. Em
Efésios, 4:12-13, se encontra demonstrado esse modelo de homem para o qual a
educação cristã deve conduzir: a imagem de Cristo.
Segundo essa passagem, a igreja deve educar ou aperfeiçoar
seus membros para que cumpram adequadamente o ministério que Deus atribuiu a
cada um. Desta forma, interatuando todos em seu ministério para com os outros,
cada membro alcança um crescimento, que pode levá-lo até a medida da “estatura
da plenitude de Cristo”.
Sintetizando, o crescimento para o qual deve apontar a
educação cristã não é a reprodução de alguns valores cristãos isolados, mas a
reprodução cabal perfeita da imagem de Cristo, com todas as implicações que
isso traz para a vida do cristão.
b) Em segundo lugar, é um crescimento que se dá em duas
dimensões. O crescimento do crente para a estatura da plenitude de Cristo se
produz em estreita relação com o crescimento da igreja.
Conforme assinalado acima, Efésios, 4:13, ensina que ao
participar da edificação do corpo de Cristo, ou seja, ao relacionar-se com
Deus, cada crente alcança seu próprio crescimento.
Do mesmo modo, o versículo 12 ensina que a edificação do
corpo de Cristo somente se produz quando ocorre o aperfeiçoamento para cumprir
seu ministério. Em outras palavras, o corpo – Igreja - se edifica desde que
cada membro individual cresça até a plenitude de Cristo.
Esta visão teológica do crescimento em duas dimensões,
aplicada ao plano educativo da escola bíblica dominical, tem implicações muito
significativas e que merecem destaque. Aponta para uma educação cristã que não
se preocupa somente com a formação de cada cristão em seu contexto individual,
mas busca, de forma equilibrada, o crescimento como corpo e o crescimento
individual, sem que a ênfase em um deles se sobreponha ao outro.
Isso significa que a educação cristã capacita a cada
indivíduo para o desenvolvimento de seu ministério, com a finalidade de que se
edifique o corpo de Cristo. Também, ao mesmo tempo, cumpre a tarefa de buscar o
crescimento da comunidade, para que ela sirva de contexto para que o indivíduo
cresça em relação com Deus e com os demais, se nutra, encontre sua identidade,
descubra seu papel e exercite seu ministério.[23]
c) Em terceiro lugar, se trata de um crescimento
sobrenatural. Ao formular uma educação cristã, ela não se torna uma receita
para que se produza o crescimento da igreja e de seus membros.
Esse é outro aspecto que distingue a educação cristã de
qualquer outra modalidade educativa: o crescimento ao qual aponta provém de
Cristo e para ser efetivo, somente é possível nos termos bíblicos, através da
entrega à obra soberana de Deus, por intermédio do Espírito Santo.
O crescimento da Igreja, portanto, não conta com fórmulas capazes
de fazer com que se torne realidade num passe de mágica, mas é o resultado de
reflexões e experiências, sensibilidade e responsabilidade, traduzidas no
reconhecimento da importância fundamental da escola bíblica dominical para o
fortalecimento da comunidade cristã.
O que importa é acertar a proposta, fornecer a resposta de
fé e amor esperados, não no terreno das lutas políticas, mas no terreno da vida
social, pessoal, religiosa e moral, da realidade primordial acerca da
identidade da Igreja, antes de pensar em instituições e organizações humanas.
Os desafios da atualidade requerem uma resposta pessoal e
comunitária, sendo urgente saber que características devem ter o cristianismo
nas circunstâncias presentes, para ser firme e ativo, não somente para sua
manutenção, mas, sobretudo para reafirmar-se cada vez mais na cultura atual,
como alternativa e como caminho.
O crescimento da igreja parte também, diante dessas considerações,
de uma reflexão sobre como aproximar-se de tantos que se desviam como
pronunciar-se no mundo em nome de Deus e anunciar a Sua salvação, reforçando
que somente com Cristo se pode ser plenamente humano, livre e completo.
Dussel[24] observa que alguns
passos podem ser seguidos, como referência, nessa caminhada, do que se destaca:
1) Considerar que uma proposta cristã exclui uma série de
atitudes que não são compatíveis com a fé em Cristo e tampouco com a bondade de
Deus, para o que é necessário:
a) Prescindir de sentimentos negativos, como o medo, a
nostalgia, o abandono, o submetimento, a incompatibilidade, atitudes que não
coadunam com uma postura de fé e de fidelidade.
É preciso assumir as responsabilidades e as exigências de
uma verdadeira convivência, com base em dois imperativos básicos – fidelidade e
evangelização.
b) Não se pode pretender mudanças repentinas ou novidades
milagrosas, repentinas, gratificantes;
c) Não é possível delegar responsabilidades aos outros.
Assim, de um em um, se omitem responsabilidades e não se iniciam as mudanças;
d) É preciso assumir as próprias responsabilidades,
juntamente à ação permanente de Deus, da qual todos são protagonistas, uma vez
que Ele assim o deseja e, sem que Ele atue através da Palavra, nos corações de cada
pessoa, nada se faz.
2) Esclarecer e organizar os objetivos, reconhecendo o
patrimônio espiritual da Igreja de forma intensa, e a existência de muitas
pessoas que, por amor, estão dispostas a trabalhar.
A partir da grande história e da realidade atual que,
muitas vezes, não é levada em conta, é possível e necessário, conforme afirma
Dussel, contar com a “ajuda de Deus, com o valor permanente da Palavra, com a
força do Espírito Santo e a motivação das pessoas chamadas a ser filhos de Deus,
feitos à sua imagem e semelhança”.[25]
A primeira imposição é mobilizar, conscientizar, animar,
ser coerentes, dar exemplos de fidelidade, de satisfação e de eficiência,
vivendo com alegria e santidade, até que essa atitude seja adotada por outros.
Consequentemente, também exige que se atue com ordem e disciplina, concentrando
esforços em objetivos especialmente estratégicos:
- Começar pela comunidade, reconstruir a fé e a vida
pessoal. A fortaleza da Igreja está na presença do Senhor e na sinceridade da
fé, conhecimento, adoração, obediência e amor. É aqui que se deve buscar a
fortaleza e o apoio para começar a atuar.
- É preciso fortalecer os cristãos, esclarecendo os
conteúdos e, sobretudo, fortalecendo as adesões, até que a fé chegue a ser
princípio determinante da vida inteira dos fiéis. Há muitos que se creem
cristãos, mas não vivem a verdade da Palavra. Há muitas formas de viver a
própria fé que podem ser suficientes de certa maneira, mas que são
insuficientes para a vida pessoal e, mais, para o crescimento da Igreja como
comunidade e para o desenvolvimento de um sentimento de pertinência a essa
comunidade.
- É imprescindível adequar os comportamentos,
praticar, atuar, militar. Os adultos não vivem assim e não educam os jovens
dessa maneira, gerando muitas incertezas, silêncios, condescendências,
personalismos e desobediências. Incentivar os filhos a participar das escolas
bíblicas é um dos caminhos para que, de modo reverso, as falhas nas atitudes
dos pais sejam compensadas pela educação cristã das novas gerações.
- É preciso evoluir para comunidades cristãs que o
sejam verdadeiramente, considerando a comunhão espiritual a escola bíblica
dominical como elementos determinantes, que dão realidade interior e
visibilidade à comunidade cristã.[26]
A segunda imposição, do ponto de vista pastoral, é levar a
sério a recomendação de voltar às fontes, observando que as fontes da fé, no
que se refere aos conteúdos são, sobretudo:
- o reconhecimento da existência divina;
- a fé em Jesus Cristo como Filho de Deus, testemunha de
seu amor, salvador único e necessário da humanidade;
- o reconhecimento do amor de Deus e do amor
fraterno como resumos e meios de superação da lei natural;
- o valor central das Escrituras, a tradição e o
magistério universal da Igreja como fontes da fé, instrumentos de unidade e
guias da consciência cristã. Tudo isso informa e enriquece as práticas
fundamentais e os objetivos principais da comunidade cristã;
- a iniciação cristã, formada pelo conhecimento e
interiorização da Palavra, através de uma educação adequada, com a colaboração
de toda a comunidade, comprometendo os pais na tarefa compartilhada de educar
os filhos na fé;
- a atenção e dignificação do matrimônio e da
família, num mundo no qual o verdadeiro matrimônio já não existe, tendo sido
volatilizado pela cultura civil, que apregoa a liberdade sem compromissos, a
sexualidade sem amor e sem entrega verdadeira. O matrimônio cristão necessita
ser uma verdadeira profecia de amor, na qual os que se casam devem conhecer e
viver sua vocação de testemunhas e colaboradores do amor de Deus e encaminhar
seus filhos para que desde cedo vivenciem a plenitude do conhecimento da
verdade.[27]
A terceira imposição, partindo dessas premissas, é que a
Igreja se faça presente na sociedade, pela reivindicação de cada um do direito
de apresentar-se e atuar de acordo com a sua fé, não aceitando a pretendida
separação entre a vida privada e a vida pública. Essa separação, além de se
mostrar inadequada, confusa e enganosa, não permite a efetiva aceitação de
Cristo como o único modelo de vida e da Igreja como ponto de apoio e de reforço
dessa atitude de viver em conformidade com a Palavra.
Conclusão
Inicialmente, conclui-se que uma das maiores contribuições
da escola bíblica dominical para a igreja é lançar um desafio permanente para
que a educação cristã seja uma educação de qualidade, não apenas um conjunto
organizado de crenças doutrinárias que podem ser repassadas às pessoas, que as
conhecerão e, por isso, passarão a crer. Como já dizia o Revendo Abel Côrte;
- Doutrina bíblica é o conjunto de ensinos e princípios básicos em que
esse fundamenta um sistema religioso, filosófico e político.
- Doutrina bíblica é o conjunto básico de ensinos da palavra de Deus
onde se baseia e fundamenta a fé do cristão.
- A doutrina bíblica é sempre uniforme, isto é, é a mesma em todos os
lugares, para todas as pessoas, em todos os tempos[28]
Uma visão contrária a essa verdade desloca a Palavra de Deus
do lugar central na tarefa educativa, fazendo com que deixe de ser Palavra viva
e se reduza a uma letra que deve ser aprendida.
Assim, é fundamental a interação da Palavra com a
experiência cotidiana da comunidade e de cada um de seus membros para que a
Bíblia cumpra com seu propósito de ensinar, corrigir, instruir o homem para que
seja perfeito, preparado para desempenhar a sua obra.
Essa interação ou diálogo entre a Palavra e a experiência
cotidiana transforma a vida real que, por sua vez, confronta a Palavra, levando
a respostas pertinentes, que concretizam a formação do homem.
Dessa forma, repetir as Escrituras, falar delas em todo
momento e lugar não significa acumular conhecimentos bíblicos, mas a união da
Palavra de Deus à experiência cotidiana, de tal forma que essa experiência se
modifique pela Palavra implica em crescimento pessoal, que se traduz em
crescimento da comunidade a qual o homem pertence.
Outra conclusão que ressalta do estudo realizado é que a
educação cristã, não sendo a transmissão pura e simples de conhecimentos
bíblicos, é uma capacitação para a vida.
O exemplo da forma como Cristo se dirigia aos seus
discípulos é ilustrativo de uma educação que forma na vida e para a vida,
porque Cristo não falava em um modelo, mas Ele era o modelo. Seus discursos não
eram feitos com base em situações formais, realizados em locais determinados ou
em horários fixos, com esquemas preestabelecidos; o ensinamento era
desenvolvido no contexto da vida.
Na presença de situações reais, Cristo era indagado, reagia,
ensinava, realizava obras, demonstrando como se deve viver, em uma constante
interação pessoal.
Esta interação é a chave para uma educação cristã que se
proponha a auxiliar no crescimento da igreja. Apenas na relação interpessoal se
pode descobrir a Palavra de Deus agindo na vida de seu povo e superar o nível
de crença ou os conceitos aprendidos.
A relação interpessoal também possibilita um ministério
recíproco entre os cristãos, no qual uns proporcionam exemplos aos outros, em
termos de estímulos para um estilo de vida mais significativo. Essa relação
cria um ambiente de aceitação, apoio, ajuda mútua e amor, clima propicio para
que se produza um crescimento.
Enfim, conclui-se que a educação cristã, através da escola
bíblica, se não prescinde da formação dos mestres em métodos e técnicas,
somente contribui para o crescimento da igreja quando participa de um projeto
maior, de fortalecimento e de crescimento de cada discípulo, para que cada um
contribua, com sua obra, para esse crescimento.
A ideia de comunidade, portanto, se sobrepõe à ideia da
formação individual e a estas se sobrepõe à ideia do Espírito Santo, que torna
possível essa realidade ao permitir que cada um compreenda em seu coração, a
Palavra de Deus e a vivencie em todos os momentos.
A missão evangelizadora e humanizadora da Igreja vivem em tempos
de prova, que desafiam para tempos de renovação, de evangelização, de
regeneração moral da sociedade, de convivência de paz. O testemunho que o mundo
espera da Igreja e das práticas propostas por ela é de segurança, de esperança
e de confiança incondicional no homem, inspirado pela Palavra de Deus e
vivenciando a internalizacao dessa Palavra, em todo o seu significado.
Esse testemunho, na sociedade, emana da sua identidade como
comunidade que vive do – e para – o Evangelho. A fé, ativa no amor, na
contemplação da Palavra de Deus, busca estabelecer a justiça nas relações e nas
estruturas sociais, respondendo com gratidão à tarefa de responsabilizar-se
pelo bem comum.
O futuro da igreja, portanto, indica que ela continuará a
ser um agente de mudanças e um agente de transmissão da fé, uma comunidade de
redenção cujas tarefas de reconciliação e de expiação, de evangelização e de
edificação, de adoração e de testemunho, continuarão a se relacionar
intimamente entre si e como os crentes que a compõem.
A construção de uma comunidade ampla, que ajude nos momentos
de necessidade, que auxilie na compreensão da Palavra e na interpretação da vontade
de Deus para a vida do homem, do perdão e da reconciliação, para que ele cresça
nessa relação, consigo mesmo, com o próximo e com a realidade social, é
possível e necessária.
Esta comunidade de fé não é um sonho, mas a realidade a que
Deus chama, da qual depende a sobrevivência de todos os cultos religiosos e as
respostas às necessidades dos homens.
Igualmente, essa realidade é medida pela sua capacidade em
promover experiências que se mostrem como sendo essencialmente diferentes da
realidade de isolamento, de individualismo e de sofrimento que é vivida por
todos os homens na atualidade.
A esperança para o futuro, a perspectiva de crescimento, é
que a igreja reconheça cada vez mais que a educação cristã não é apenas uma
atividade ou um complemento de sua prática doutrinária, mas um ensinamento para
– e por – toda a vida.
A natureza da educação bíblica cristã deve insistir em que a
igreja seja cada vez mais o reflexo de Cristo, de quem é o corpo e do homem,
para o qual existe, com uma função que envolve o acesso direto de cada homem a
Deus, mas também a responsabilidade de tornar cada homem capaz de falar a favor
de Deus, de interceder perante Deus em favor de cada homem, conclamando a
unidade e ao serviço, na vontade de Deus.
“A Escola Bíblica
Dominical é um curso de teologia celestial de graça”
(Silvio Ribeiro)[29]
Por: Reverendo Silvio Ribeiro
(Teólogo e Pastor da 1ª Igreja Cristã Presbiteriana em Cidade Ocidental-GO).
Obs. Este estudo foi extraído do meu TCC, e faz parte para obtenção do titulo de Bacharel em Teologia pela SEBI-DF).
[1] LEMME,
Paschoal. Memórias: Reflexões e estudos
sobre problemas da educação e ensino. São Paulo: Cortez/INEP, 1989, p. 54.
[2] MONTI, Emilio. Extensão e
educação permanente. Cadernos de
Teologia, v. 5, n. 2, Lisboa, abr./1978, p. 27-31.
[3] MONTI, Emilio. Op. Cit.
[4] MONTI, Emilio. Op. Cit.
[5] MONTI, Emilio. Op. Cit.
[6] MONTI, Emilio. Op. Cit.
[7] COSTAS,
Orlando E. O Protestantismo na América Latina hoje: ensaios do caminho. Cadernos de Teologia, v. 5, n. 2, Lisboa, abr. /1978, p. 41-76.
[8] MONTI, Emilio. Op. Cit.
[9]
TAWNEY, Richard Henry. A religião e o surgimento do capitalismo.
São Paulo: Perspectiva, 2001, p. 189.
[10]
MCKEE, Elsie Anne. Os Ofícios de Presbítero e Diácono na
Tradição Reformada Clássica. In MCKIM, Donald (ed.). Grandes
Temas da Tradição Reformada.
São Paulo: Associação Evangélica Literária Pendão Real, 1998, p. 18.
[13] CHARTIER,
Roger. A história cultural: entre práticas e representações.
Lisboa: Difel, 1990, p. 107.
[15] BONINO,
José Miguez. Rosto do protestantismo latino-americano. São Leopoldo:
Sinodal, 2002, p. 54.
[16] BONINO,
José Miguez. Op. cit., p. 55.
[17]
NASCIMENTO, Ester Fraga Vilas-Bôas Carvalho do. Associações voluntárias,
missões protestantes e a história da educação. ANPED. Disponível em http://www.anped.org.br/reunioes/32ra/arquivos/trabalhos/GT02-5281.
Acesso em 25 de junho de
2011.
[18] ZUCK, Roy B. Poder espiritual en la enseñanza: un
estudio bíblico y doctrinal acerca del ministerio docente del Espíritu Santo.
México: Ediciones Las Americas, 1995, p. 64.
[20] ZUCK, Roy B. Op. Cit., p. 123.
[21] ZUCK, Roy B. Op. Cit., p. 123-124.
[23] SCHAEFFER, Francis A. Op. cit., p. 9.
[24] DUSSEL, Enrique. Ética da libertação na
idade da globalização e da exclusão. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 39-44.
[25] DUSSEL, Enrique. Op. Cit., p. 40.
[27] DUSSEL, Enrique. Op. Cit., p.
44.
[28] Côrte,
Abel: A Suficiência Humana vem de Deus.
Brasília-DF, 2007, p.173.
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